Durante a faculdade de Administração eu lembro que quando líamos e conversávamos sobre casos de sucesso de gestão, os exemplos eram sempre a General Eletric, a Coca-Cola, Peter Drucker e Jack Welsh.
Aquilo sempre parecia muito distante da realidade da maioria de nós em sala de aula e das empresas brasileiras.
No fim do curso eu comecei a me interessar na área de Marketing e passei a estudar e ler sobre Publicidade. Pensava que acabaria trabalhando em uma agência.
Nessa época todo e qualquer evento que eu ia os casos de sucesso envolviam a Nike e a Coca-Cola.
Marcas gigantes, que foram construídas ao longo de muito tempo e que não serviam de parâmetro para a maioria das pessoas que estavam nesses eventos.
Acabei trabalhando com Marketing Digital e surgiu uma oportunidade de trabalhar em uma Startup.
Desde então, eu mergulhei nesse mundo novo e tecnológico e uma coisa me chamou a atenção.
Enquanto no passado era General Eletric, Coca-Cola e Nike as marcas que dominavam, no mundo das Startups todo mundo fala e quer ser os famosos unicórnios (startups que passam a ser avaliadas em 1 bilhão de Dólares) e seus fundadores.
Não é mais Jack Welsh e Peter Drucker, mas sim Zuckerberg e Peter Thiel. As empresas tradicionais dão lugar ao Slack, AirBnb, Facebook, Google e Uber.
Mas no fim das contas o problema é o mesmo: a maioria de nós, profissionais de Marketing em startups, estamos muito longe da realidade de investimento que levou essas empresas a explodir de forma escalável.
Daí nos enganamos lendo sobre Growth Hacks e que só precisamos descobrir aquele que vai fazer tudo escalar.
Afinal, acabamos de ler o case do mais novo unicórnio.
Ou então achamos que é muito fácil crescer da noite por dia, porque lá no fórum Growth Hackers lemos como uma startup conquistou 10 mil leads e 50 mil dólares em vendas com um hack genial.
Na verdade, tudo isso é bobagem.
Assim como no mundo dos negócios e das empresas tradicionais, muitos mitos e histórias tomam lugar da realidade.
Só pra deixar claro, eu gosto de acompanhar o fórum Growth Hackers, leio sobre as grandes empresas e o que elas fazem (tanto as tradicionais quanto as startups), mas não acho que lá irei encontrar a fórmula secreta, a famosa bala de prata.
O que importa é olhar o que aconteceu e pensar com os pés no chão o que significa aquela informação na prática.
Quando escrevi o post argumentando que Growth Hacking é Marketing, mostrei que as estratégias que citam como hacks não passam de decisões dentro dos 4 P’s de Marketing, principalmente na que diz respeito ao P de Promoção.
Enfim, a verdade é que a vida em startups não é baseada em pensar em ideias mirabolantes que vai gerar o famoso gráfico do taco de hockey:
Em um artigo bem famoso do Paul Graham com o título Do Things That Don’t Scale ele comenta que a maioria das startups que explodiram e cresceram exponencialmente tiveram um início onde os fundadores e a equipe fizeram muito trabalho manual, duro e sem todo o hype do mundo das startups.
No primeiro parágrafo ele diz:
A lot of would-be founders believe that startups either take off or don’t. You build something, make it available, and if you’ve made a better mousetrap, people beat a path to your door as promised. Or they don’t, in which case the market must not exist.
Isso é muito verdade.
Enquanto nos enganamos com os unicórnios achando que eles tiveram poderes mágicos, pensamos que se isso não acontecer com a nossa empresa é porque ela não vai sair do papel.
Ela pode dar certo e nunca explodir. Assim como pode explodir e da noite pro dia sumir do mapa.
É muito difícil acertarmos em cheio o dia de amanhã, mas o que não podemos fazer é esquecer que nosso trabalho como profissionais de marketing em startups ou se preferir growth hackers, é gerar valor e fazer o produto/serviço que oferecemos gere receitas.
Nenhum atalho irá fazer isso pra gente.
E isso nada mais é do que entender e diferenciar o marketing estratégico e sua teoria do marketing tático e suas aplicações.
Um texto publicado no Techcrunch ano passado com o título “How Google Analytics ruined marketing” argumenta que profissionais de marketing no mundo high-tech não entende muito bem a diferença entre marketing estratégico e tático (que ele divide entre canais e conteúdo).
Devido a isso ele critica toda uma subdivisão do marketing como se fossem coisas diferentes de uma mesma atividade. Da exemplo disso falando:
No one ever said “television marketing”
Essa falta de um entendimento mais profundo de como o marketing realmente funciona pode ser que venha de um certo preconceito que se tem sobre a atividade de marketing que por muito tempo se focou mais em promoções (propagandas) e menos na parte de construir valor.
Para startups parece que essa história de construir valor e marca leva tempo e não é o que uma startup precisa porque ela tem que crescer rápido.
Um texto interessante sobre o assunto entre marketing e startups é o “Why Founders Fail To Market Their Products”.
O autor escreve sobre alguns mitos que ele vê sendo difundido e tenta mostrar onde está o erro de um fundador e de uma startup que está começando.
Existe aquela conversa sobre construa um produto excelente e as pessoas irão usá-lo. Alguém realmente consegue acreditar que é assim que as coisas funcionam?
Um dos mitos está ligado a esse assunto e o autor diz:
Myth 3) Most marketers don’t get it
During the first year, I interviewed dozens of marketers. I got them to draft a marketing plan for my company and walk me through it. I was waiting for someone to tell me how to generate a huge amount of high-quality traffic to the landing page, for free, almost immediately.
But no-one offered me a silver bullet. And I never made an offer.
Most of the marketing plans looked boring. One marketer told me that ‘a brand isn’t created overnight — it takes many months of messaging to build a reputation’.
Many months? I want growth NOW! I don’t have funding for ‘many months’. There must be a hack. There is a hack… but it’s not what most founders think.
Hire a marketer months before product launch to begin marketing development activities early.
Marketing é uma construção e deveria começar a ser pensado antes mesmo do produto estar pronto ou ser desenvolvido.
Não precisa necessariamente iniciar contratando um profissional, mas pelo menos com o fundador e a equipe trabalhando na estratégia e táticas a serem exploradas.
Nós profissionais, entusiastas e estudiosos da atividade de marketing precisamos colocar na nossa cabeça que as histórias das empresas com todo o hype no momento não servem para tentarmos achar atalhos e hacks.
Precisamos estar cientes que quando chega até nós toda história foi simplificada e até muitas vezes nem é tão perto da realidade.
Vamos mostrar ao mercado das startups e de tecnologia que nada é fácil, que estratégia é tão importante para se construir táticas efetivas.
Vamos por os pés no chão. Não existe bala de prata.
Esse artigo escrevi em 2016 no meu blog antigo e quando mudei de plataforma (Ghost para o Github Pages) ele estava apenas em meu Medium. Resolvi republicá-lo aqui.